The Forked Road é daqueles discos que fluem tão bem, que ouvi-lo em looping por várias horas não seria nenhum problema.
Qualquer um que conheça o trabalho de Richard Wileman como lider e principal compositor da banda Karda Estra, já pode imaginar que tipo de música vai encontrar em qualquer um dos seus discos solos, porém, longe de sua banda, o músico pode ser ainda mais sombrio e taciturno. The Forked Road, seu quarto trabalho, é um grande exemplo disso. Segundo palavras do próprio Wileman no encarte do álbum, “The Forked Road é um álbum conceitual de terror progressivo/folk, enraizado no condado de Wiltshire, que mapeia o encontro de um cometa com a Terra e que resulta em uma convergência de mortos vivos em direção a The Ridgeway”.
Apesar de eu considerar Wileman um nome extremamente importante dentro da cena progressiva do século XXI, também consigo entender o motivo dele nunca ter recebido a quantidade de aclamação merecida, afinal, muitas vezes a sua área musical transcende o progressivo e se agarra em algo que mais se parece com a música clássica moderna, além de aliar-se em sonoridades que lembram trilhas de filmes de terror, dando uma ideia de música bastante visual. Outro ponto que deve ser levado em consideração, é o fato dele se apresentar muito pouco ao vivo, sendo o principal motivo, a utilização de uma variedade muito grande de instrumentos, porém, isso também é um dos motivos que tornam seus discos muito bons de ouvir.
“The Last Book of English Magic” é a primeira música do álbum e já diz bastante sobre o tipo de humor que será encontrado em The Forked Road. Uma peça instrumental cheia de beleza, mas que também carrega muita melancolia e até um pouco de angustia. O trabalho dedilhado de violão e as lindas linhas de harpa são os destaques, mas tudo aqui é envolvente e encantador. “Butterfly” começa por meio de violões cativantes, mas que logo ganham a companhia dos vocais melódicos de Richard. Os teclados são intrigantes e a guitarra quando acionada encaixa pequenos solos em trechos pontuais.
“The Forked Road” é mais uma faixa instrumental e experimental, de clima enigmático, como é de costume, pode ser considerada uma espécie de trilha sonora de um filme de terror inexistente. Novamente, o trabalho de harpa de Chantelle Smith é muito bom, soando em determinados momentos até mesmo um pouco dissonante, porém, ainda dentro de toda a ambientação proposta no álbum, sendo um dos seus momentos mais sombrios. Em “Children of the Sun”, Wileman tem a companhia de Amy Fry nos refrãos. A faixa é basicamente voz e violão - com sintetizador e guitarra às vezes aparecendo de forma tímida - e tem um clima bastante onírico e delirante, onde é descrito a vida daqueles que já partiram e estão prestes a reencarnar.
“Avenue & Circle”, Chantelle Smith está de volta com a sua harpa hipnotizante e acompanha o violão e teclados atmosféricos de Wileman, uma música que é tocada de forma espaçada, com batidas que ocorrem de uma maneira acidental e entregam para o ouvinte uma experiência sônica assombrosa, sendo também mais um dos momentos mais sombrios do disco. “Comet VS The Earth”, agora quem está de volta é Amy Fry com os seus vocais celestiais, além de também entregar uma performance de clarinete, enquanto isso, mais uma vez, por meio de violão e teclado, Wileman cria uma uma harmonia de aura enigmática. Aqui estamos em um ponto importante do conceito do disco, onde os mortos são gradualmente trazidos de volta a vida pela passagem do mencionado cometa.
“Old Bones” é uma música que tem uma boa fluidez e me faz lembrar bandas de rock psicodélico da segunda metade dos anos 60 e que faziam tão bem aqueles duo vocais masculino e feminino - ainda que eu ache que pra esse disco ela ficou um pouco deslocada. Além da harpa, Chantelle é quem também assume os vocais que acompanham Richard.
“Spectres of the Ridgeway”, com os seus cerca de seis minutos e quarenta segundos é a música mais longa do disco. Além da companhia de Amy Fry no saxofone e de Chantelle Smith na harpa, Richard - violão e teclado - também convida sua filha, Sienna Wileman, para acrescentar alguns efeitos sonoros e o resultado foi a melhor composição do álbum. Uma música de vanguarda que é impressionante e transcendental, além de sinistra e assustadora que cresce no ouvinte conforme se desenvolve.
“The Inevitable Beast”, aqui os destaques ficam por conta das ondas sombrias dos teclados atmosféricos e vocais dramáticos de Wileman. A forma como é desenvolvida, faz com que o ouvinte se questione se a criatura citada é apenas simbólica e a realidade é que no fim tudo deu certo para a humanidade, ou temos que ouvir o disco mais uma vez e ver se perdemos algum detalhe do seu enredo. “The First Book of English Magic” encerra o disco mostrando o outro lado da peça que o iniciou. Com menos de dois minutos, é a menor faixa do álbum, possui um bom trabalho de violão e teclas bastante harmoniosas que criam um clima taciturno que permeou todo o disco.
The Forked Road é daqueles discos que fluem tão bem, que ouvi-lo em looping por várias horas não seria nenhum problema, porém, há um outro lado dessa moeda, pois sua música pode não ser muito fácil caso o ouvinte procure algo diferente de um álbum com paisagens sonoras cinematográficas construídas por meio de desenvolvimentos melódicos muitas vezes mórbidos e alguns silêncios sepulcrais.
The Forked Road
Richard Wileman
Ano: 2024
Gênero: Progressivo, Música Ambiente, Minimalista
Ouça: “Spectres of the Ridgeway”, “Avenue & Circle”, “Children of the Sun”
Humor: Sombrio, Fúnebre, Melancólico
Pra quem curte: Karda Estra, Lives and Times
Comentarios