Cate Blanchett transborda talento dando vida a uma maestrina de música clássica fictícia durante uma árdua crise em sua carreira
Tár é uma obra densa e complexa que ganha uma enorme proporção materializada pelo brilhantismo e talento de Cate Blanchett. Porém, Apesar da atuação de Blanchett, pode ser difícil e um pouco maçante acompanhar a trama. Partindo desse pensamento e ponto de vista, se torna genuinamente impossível imaginar outra pessoa além de Cate, realizando isso com tamanho sucesso e talento. O filme do diretor Todd Field, pode exigir do telespectador paciência e tempo.
Blanchett dá vida a Lydia Tár, uma grandiosa maestrina em uma conceituada orquestra alemã. Conhecemos Tár quando ela estava no auge, preparando um livro e uma apresentação ao vivo. Nas semanas seguintes, sua vida segue de uma maneira moderna. O resultado é um exame do poder e seu impacto e durabilidade na sociedade atual. Lydia aparenta ter uma vida perfeita, trabalha na Orquestra Filarmônica de Berlim, ela não apenas dirige os músicos, como também os manipula, assim como faz em sua vida pessoal, para ter controle de tudo ao seu redor. Contudo, um dia ela é acusada de assediar uma musicista e de ter atitudes impróprias com alunos em um curso que ministra. A partir de então, sua vida começa a ruir e lentamente ela vai perdendo a capacidade de controlar tudo aquilo que imaginava ter controle.
Tár é daquelas obras que te desafia a pensar, refletir e a enxergar os bastidores por trás da música clássica, e logo percebemos que não é tão simples quanto parece ser. Porém, o contexto que Field agrega a personagem Lydia e o talento de Blanchett conduzem a narrativa para um ensaio cinematográfico construído de uma forma tão convincente, que vemos em Lydia uma síntese da própria hipocrisia e negação. E, a cada movimento, a cada cena, vamos captando mensagens sobre o discurso do #MeToo e da 'cultura do cancelamento', sem, contudo, ser extremamente polêmico e forçado.
Isso é o que acontece quando uma ideia de um cineasta brilhante encontra a sensibilidade e desenvoltura de uma atriz no escalão de Cate Blanchett. O filme concorreu ao Oscar, indicado em seis categorias, entre elas a de Melhor Filme e Melhor Atriz. Não é fácil pegar uma história como a de Tár e transformá-la em uma narrativa potente sobre o machismo, abusos de poder, situações que ocorrem nos bastidores da música clássica. Muito disso, parte do excelente roteiro escrito por Field, o gás necessário para o filme explodir em uma trama intensa que vai se desenrolando lentamente. Como disse no início deste texto, pode parecer maçante e cansativo, mas o resultado final de Cate em cena é satisfatório e comovente.
A atriz australiana já coleciona diversos oscars em sua carreira, em Tár ela simplesmente está deslumbrante e fenomenal. O filme estreou no último Festival Internacional de Cinema de Veneza, em setembro de 2022, com Blanchett faturando a Copa Volpi de Melhor Atriz.
O filme é sobre a atualidade na qual vivemos, aborda temas atuais e pertinentes. Além de esbarrar naquela velha pergunta que soa tão polêmica e divisível: “devemos separar a arte do artista?” Em muitos momentos impactantes, Field equilibra a força de seu soco na "boca do estômago".
À medida que a história se desenrola, o longa vai se tornando cada vez mais envolvente e impactante, e a atuação de Blanchett se torna cada vez mais intensa. É nesses instantes que você prevê o que está por acontecer. É como se fosse um ataque de pânico chegando lentamente até atingir o pico.
Fora isso, o filme ainda conta com uma linda trilha sonora da compositora islandesa indicada ao Oscar Hildur Guðnadóttir - mais conhecida por seu trabalho no filme Coringa de Todd Philip em 2019 e na aclamada e potente minissérie Chernobyl. O longa também se abastece de boas reviravoltas provocadas pelos talentos de Mark Strong e da prolífica atriz de cinema e televisão alemã Nina Hoss.
O grande impacto de Tár se forma na paisagem que ele reflete em cada um de nós. Um filme que ultrapassa os limites e aborda os preconceitos de uma sociedade munido de um inteligente humor ácido. Lydia Tár pode muito bem ser aquele "monstro" pelo qual não podemos deixar de torcer, mesmo em seu pior graças ao talento e conduta de Blanchett.
Este é um longa-metragem inteligente e muito envolvente que te faz questionar os seus próprios preconceitos e simpatias. Você pode até sentir falta de um coração pulsante, ou até mesmo achar desnecessário as tomadas de suspense e cenas que beiram o gênero sobrenatural, contudo, Tár é uma ótima obra sobre as bases e estruturas que sustentam o poder.
Tár (2022)
Tár
Ano: 2022
Direção: Todd Field
Roteiro: Todd Field
País: EUA
Elenco: Cate Blanchett, Nina Hoss, Mark Strong, Noémie Merlant
Classificação: 12 anos
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