Neste filme, o diretor sueco Ruben Östlund vai abrir algumas feridas de nossa sociedade e expor uma sátira social bem contundente.
Triângulo da Tristeza ganhou a Palma de Ouro em Cannes. Entrou no Oscar concorrendo a 3 premiações, não levou em nenhuma categoria. De uma forma geral, talvez seja o tipo de filme que não foi tão apreciado quanto o restante dos seus concorrentes. E daqui a alguns anos, quem sabe, seja mais lembrado que agora. Uma espécie de Cult Movie?
Neste filme, o diretor sueco Ruben Östlund vai abrir algumas feridas de nossa sociedade, expor uma sátira social bem contundente, provocar a classe alta e os privilégios, embora isso não seja digerido prontamente. Também existe espaço para debater sobre o poder das redes sociais na atualidade ('mais vale se mostrar para meus seguidores do que estar feliz com aquilo'), além do endeusamento que muitas vezes damos a algumas personalidades.
Não é um filme fácil. Com seus quase 146 minutos de duração, já se inicia de forma estranha, sobretudo para quem lê a sinopse e espera algo dela logo nos primeiros minutos. Modelos masculinos são entrevistados e questionados porque escolheram essa profissão. Logo em seguida, vemos o jovem e bonito casal de modelos Yaya (Charlbi Dean) e Carl (Harris Dickinson) depois de um jantar discutindo sobre quem vai pagar a conta.
Claro que esse início não é à toa. O diretor começa a instigar o espectador para os diversos temas que seu filme pretende abordar. Apesar da boa vida e da beleza de Yaya e Carl, o relacionamento é regido por ciúmes, machismo, incertezas e conflitos. Essa é a primeira parte do filme que, apesar de lenta, nos pede para seguir adiante. O filme terá mais duas partes, sendo que é a segunda que chega de forma catártica, contundente e revigora ainda mais os objetivos do diretor.
Um repertório de personagens, ufanos de si, se orgulhando de suas conquistas milionárias. O casal que se sente feliz por vender granadas, o empresário que se gaba de ter sido o primeiro a ganhar dinheiro vendendo estrume, a madame que pede para a funcionária trocar de lugar com ela porque está simplesmente achando sua vida monótona demais e precisa inventar algo.
Em certa parte do filme, fácil lembrar-se dos incríveis tempos do grupo inglês Monty Python. A cena que pode ser escatológica para muitos espectadores, me lembra a passagem épica do restaurante em O Sentido da Vida (1993). Exemplo é o trecho onde acontece o jantar do capitão. Ali nada mais é que a soberba humana sempre querendo mais, independente do quanto esteja satisfeita, não importa o mal que possa enfrentar pela frente.
O enjoo não acontece apenas na tela quando o navio é cometido por um mar revolto, também é transmitido ao espectador que sente nojo e repulsa de um desfile egoísta e hipócrita de pessoas milionárias.
Um dos destaques do filme chega através do capitão Thomas (boa atuação de Woody Harrelson). Ele sequer sai de sua cabine, tem asco e pavor de aparecer no jantar junto aos convidados ricos e prefere comer um hambúrguer a um prato chique. Após uma bebedeira, dispara verdades aos passageiros presentes se valendo de questões filosóficas, com muito Lenin servindo de inspiração.
Não apenas um navio luxuoso de 250 milhões que começa a ruir, como também um tapa de luva numa sociedade que está ali mais preocupada com o champanhe caro servido do que com o mundo ao redor.
A terceira parte, infelizmente, não é tão interessante e não complementa totalmente o impacto da parte anterior. Em contrapartida, é um instante para mostrar como cargos podem mudar de posição, valores podem ser invertidos e até aquele funcionário que sequer dávamos atenção pode ser a pessoa importante para nossa sobrevivência.
E existem aqueles que não mudam suas personalidades, como o rico que ao invés de chorar pelo falecimento da pessoa amada, prefere tirar as joias do corpo dela e ainda lucrar com isso no futuro. Ao mesmo tempo, um homem afrodescendente é confundido com um pirata porque um dos passageiros considera que ele sequer tem condições de ser tripulante de um navio luxuoso.
Com um final em aberto (que alguns sites fizeram questão de explicar), Triângulo da Tristeza não é eficiente e coeso em todas as 3 partes que apresenta. Entretanto, as mensagens, as críticas e as provocações que Ruben Östlund pretende passar estão incautas, servem dentro do propósito do diretor. A catarse está ao menos realizada.
Triângulo da Tristeza
Triangle of Sadness
Ano: 2022
País: EUA
Direção: Ruben Östlund
Roteiro: Ruben Östlund
Elenco: Harris, Dickinson, Charlbi Dean Kriek, Woody Harrelson, Dolly De Leon
Duração: 2h 27min
Classificação: 16 anos
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