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Foto do escritorMarcello Almeida

The Suburbs, 15 anos depois: Um retrato atemporal da nostalgia e da modernidade



Um disco que captura, com maestria, sentimentos universais.

Imagem: Reprodução.

Olhar para The Suburbs, terceiro disco do Arcade Fire, lançado em agosto de 2010, é revisitar memórias de um tempo que não volta mais. É lembrar de espaço, movimento e lugar; talvez seja por isso que, rapidamente, o disco transcendeu o universo do indie rock e se consagrou como um dos álbuns mais marcantes do século XXI. Nessa brincadeira, lá se foram 15 anos, e, todo esse tempo depois, essas canções continuam ressoando com uma força descomunal e intocável pelos efeitos do tempo.


Quer dizer, nesse caso aqui, o tempo foi um ótimo aliado de The Suburbs, o que me leva a acreditar que esse, sim, possa ser um OK Computer do subúrbio imaginado como um lugar e ideia. Sua complexidade de arranjos e letras pontuais escancara as inquietações de uma geração em plena transição, presa entre a nostalgia e as demandas de um mundo cada vez mais veloz e tecnológico.


O que me leva a pensar nesse processo evolutivo do Arcade Fire como banda. Eles já haviam alcançado, literalmente, o status de cult com Funeral (2004) e Neon Bible (2007). Uma dobradinha sensacional que apresentou ao mundo toda a estética expansiva e emocionalmente crua e desnuda da banda, liderada pelo casal Win Butler e Régine Chassagne.


Entretanto, Suburbs chegou ao mundo representando uma evolução significativa, trazendo em sua pele as memórias de infância de Butler nos subúrbios de Houston, Texas. No início deste texto, afirmei que a obra transcendeu as vertentes do indie. Cheguei ao ponto que eu queria: revisitar esse disco tanto tempo depois é se abastecer de uma nova visão, de um novo entendimento do que ele queria tanto dizer 15 anos atrás. O tempo passou para The Suburbs, passou para mim e passou para você.


Esse é um daqueles álbuns que não é apenas um conjunto de canções, mas uma coesa e poderosa narrativa sobre crescimento, perda de inocência, mudanças — de cidades, culturas — e a tão acelerada modernidade que veio com o início do milênio. O disco veio ao mundo justamente quando a era digital começava a ganhar força, e o streaming ainda engatinhava para mudar totalmente a maneira de consumir música. The Suburbs se destacou como um álbum pensado para ser ouvido do início ao fim. Esse formato foi ousado em um momento em que a atenção do público começava a se fragmentar, mas reforçou o compromisso da banda com a ideia de álbum como obra de arte.



O disco oferece ao ouvinte uma experiência imersiva. Ao longo das 16 faixas, o Arcade Fire emula um mosaico de reflexões sobre o impacto do crescimento urbano, a perda de laços afetivos e aquela agridoce sensação de deslocamento em um mundo cada vez mais homogêneo, tudo isso através de uma abordagem mais intimista e introspectiva. Isso fica bem evidente na faixa-título que abre o trabalho ("The Suburbs"). Já de cara, a banda mergulha o ouvinte em uma maré de melancolia e ambiguidade, misturada com aquele sentimento de saudade e resignação, como se a faixa fosse uma espécie de prólogo: “Sometimes I can’t believe it, I’m moving past the feeling…”, acendendo aquele desejo de retornar a um lugar que, embora familiar, mudou irrevogavelmente.


Olhar para The Suburbs nos dias atuais é encontrar em suas melodias um sentido para um mundo onde a nostalgia é, ao mesmo tempo, um refúgio e um fardo. “Ready to Start” é uma explosão de energia contida, com guitarras angulares e uma bateria pulsante que capturam a tensão entre o conformismo e o desejo de ruptura. A faixa funciona como um grito de guerra contra as expectativas impostas pelo capitalismo, um tema que reverbera em várias partes do álbum. Por outro lado, “Modern Man” explora o sentimento de alienação em um mundo acelerado, com uma melodia que parece hesitar e avançar, refletindo a incerteza do protagonista. No caso, somos nós.


Se há uma faixa que imprime de fato o espírito de The Suburbs, é “Sprawl II (Mountains Beyond Mountains)”. Comandada pela voz angelical e doce de Régine Chassagne, a música combina sintetizadores vibrantes com uma batida dançante, criando um contraste fascinante entre som e conteúdo. Chassagne lamenta a homogeneidade cultural dos subúrbios enquanto busca escapar de sua monotonia: “Sometimes I wonder if the world’s so small... Living in the sprawl / Dead shopping malls rise like mountains beyond mountains.” A canção logo se tornou um hino para aqueles que buscam escapar do tédio dos subúrbios.



Talvez a forca desse disco esteja justamente em sua abordagem e honestidade, isso para uma geração que cresceu no limiar entre o analógico e o digital, entre a segurança do passado e a incerteza do futuro, The Suburbs simplesmente se tornou a trilha sonora para suas ansiedades e aspirações, e 15 anos depois ele pode ser um espelho do presente, pois essa obra permanece tão poderosa quanto em 2010. Se antes o álbum parecia capturar um momento específico no tempo, hoje ele soa como uma profecia.


A homogeneização cultural denunciada em “Sprawl II” apenas se intensificou com o crescimento das redes sociais e da globalização. Da mesma forma, a busca por autenticidade e pertencimento abordada em faixas como “We Used to Wait” ressoa fortemente em uma era de hiperconexão digital. Arcade Fire não apenas capturou um momento no tempo, mas criou uma obra que continua a dialogar com os desafios e esperanças do presente.



Como Butler canta na faixa-título: “I want a daughter while I’m still young, I want to hold her hand, and show her some beauty before this damage is done.” The Suburbs é, no fim, sobre encontrar beleza na imperfeição, no passado e no presente – um lembrete de que, mesmo em meio ao caos, há espaço para a esperança.

 
Imagem: Reprodução.
 

The Suburbs

Arcade Fire


Ano: 2010

Gênero: Indie Rock, Rock Alternativo,

Ouça: "The Suburbs", "Ready to Start", "Sprawl II.."

Pra quem curte: Talking Heads, Neil Young

Humor: Provocativo, Intrigante, Convidativo

 

NOTA DO CRÍTICO: 9,5

 


 


 


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