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Foto do escritorMarcello Almeida

The Smile expande e aprofunda sua sonoridade nas raízes do jazz com o exuberante Cutouts

A certeza ao entrar nesse universo é que o vazio pode assumir várias formas, das quais muitas vezes não podemos escapar

The Smile


Cutouts, segundo álbum lançado este ano pelo The Smile, projeto paralelo do Radiohead, que, se bem, nem é tão mais paralelo assim, Thom Yorke e Jonny Greenwood, ao lado do baterista Tom Skinner, estão cada vez mais se aprofundando nas raízes do jazz, explorando uma sonoridade experimental e reflexiva.


As canções de Cutouts foram gravadas na mesma sessão do excelente Wall of Eyes, lançado em janeiro deste ano. A qualidade sonora não decaiu nem sequer um milésimo; o trio inglês parece ter encontrado uma liberdade, um refúgio para produzir e fazer música. O novo trabalho é recheado de presságios, com a bateria de Skinner trazendo o elemento surpresa e contagiante. A certeza que fica ao adentrar nesse universo e atmosfera propostos pela banda é de que o vazio pode ser convertido em várias formas, e muitas vezes, não podemos escapar dele.


As letras de Yorke estão cada vez mais pontiagudas, certeiras e honestas, derramando aquele balde de verdades nuas e cruas na alma. Em boa parte, Yorke é irônico e lúdico, jogando suas metáforas sobre a vida nesses tempos de modernidade e tecnologias. 

Os instantes iniciais da hipnótica e sedutora “Instant Psalm” provam por que o The Smile vem se tornando uma das grandes revelações dos últimos anos e, cada vez mais, brilhante e expansivo com suas complexidades sonoras, com as quais eles parecem se divertir à beça. “Zero Sum”, com as guitarras robóticas e espaciais de Jonny Greenwood, misturadas com saxofones e aquela genuinidade poderosa do jazz, faz da canção uma fusão de sonoridades e experimentalismo.



E uma coisa que o The Smile sabe fazer com tamanha perfeição é brincar com imaginação e curiosidade do ouvinte, isso fica evidente com a abertura singela, calma e nostálgica com a faixa “Foreign Spies”, que age como um condutor preparatório do que vai vir pela frente, tocando os sintetizadores como sinos que florescem em torno da voz bucólica e sombria de Yorke. A faixa desagua nessa corrente experimentalista e caba se tornando uma viagem cercada de folhas e paisagens. O aviso foi entregue, agora é aproveitar a viagem psicodélica de aproximadamente 44 minutos, onde você vai se sentir fora da realidade, distante do mundo e todos os barulhos da vida urbana.


Em “Eyes & Mouth”, Greenwood parece fazer da guitarra um brinquedo divertido e prazeroso. A canção logo salta para um ritmo frenético e deslumbrante, impulsionada pelas batidas rápidas de Skinner, sempre com aquela pegada jazzística. “Tiptoe” é embasada por pianos, sussurros e cordas, uma faixa que explora mais a música ambiente e lembra muito os trabalhos de Yorke e Jonny em trilhas sonoras de filmes.


“The Slip” traz toda aquela ambientação repleta de paranoia típica do mundo de Yorke. A faixa, mais lúdica do disco, logo entrega rajadas de guitarras que emanam David Bowie. Esse é o fascínio de colocar os ouvidos em um disco do The Smile: você nunca sabe o que vai encontrar até o final do álbum. Cutouts é bem mais expansivo e surpreendente do que seu irmão Wall of Eyes. É extraordinário que dois álbuns tenham nascido das mesmas sessões.


E esses recortes assim como sugere o título parecem belos demais para serem considerados sobras de estúdio, assim como aconteceu com Kid A e Amnesiac do Radiohead, um trabalho bom demais para ser deixado na sala de edição ou gavetas de estúdios. Tudo isso gera um efeito de épocas distintas: canções trazidas de volta à vida e moldadas para viverem juntas no presente, sem que cada elemento tenha um motivo claro para estar ao lado do outro, exceto o puro prazer de fazer música e conectar pessoas.



Este é um trabalho verdadeiramente encantador, repleto de sons bonitos e exuberantes, onde o processo criativo exalta os grooves envolventes, criando uma atmosfera vibrante e etérea. Em um cenário musical cada vez mais homogêneo, Cutouts se destaca como um farol de criatividade e inovação, convidando novos ouvintes a explorar não apenas a música do The Smile, mas também a rica discografia do Radiohead. Este álbum não é apenas uma coleção de canções, mas uma experiência que desafia as normas contemporâneas, mostrando que ainda há espaço para a ousadia e a experimentação na música atual.



E quem realmente precisa de um retorno do Radiohead quando se tem o The Smile? Brincadeiras à parte, isso aqui está se tornando cada vez mais exaltante, complexo, inventivo e criativo. Um bálsamo para quem realmente aprecia música de qualidade.

 

Cutouts

The Smile


Ano: 2024

Gênero: Indie Rock, Alternativo, Jazz

Ouça: "Instant Psalm",  “Eyes & Mouth”, “Zero Sum”

Pra quem curte: Memory Map, Acid Mothers Temple

Humor: Provocante, Enigmático, Complexo



 

NOTA DO CRÍTICO: 8,5

 

93 visualizações1 comentário

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1 Comment


Guest
Oct 06

Discasso!!!


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