Superboys de Malegaon concilia o poder transformador do Cinema junto ao valor da amizade

Um filme para marcar nossos corações e que merece ser visto hoje e sempre, por qualquer geração

Muitos cinéfilos certamente já imaginaram criar algo de Cinema em algum momento de suas vidas. Fácil começar a pensar que a magia da sétima arte se consiste tanto no ato de assistir quanto de dirigir. Então, quem nunca imaginou em pegar alguma câmera e assumir a direção de um vídeo, por mais curto que fosse? Claro que com os avanços da tecnologia, a produção de um filme se tornou acessível para muitas pessoas.

Superboys de Malegaon, filme do diretor Reema Kagti (Gully Boy: A Voz das Ruas, 2019), foi inspirado no documentário Supermen of Malegaon (2008) produzido pela documentarista e ativista Faiza Ahmad Khan. A história é baseada na vida de Nasir Shaikh e outros cineastas amadores na modesta e pequena cidade indiana de Malegaon.

Nasir (Adarsh Gourav) adora Cinema. Sua felicidade se consiste em passar filmes para os moradores de Malegaon. Mesmo com as sessões cheias, ele é impedido pelas autoridades de prosseguir com a exibição de filmes por se tratarem de cópias piratas. A partir de então, Nasir tem a ideia de começar a fazer seus próprios filmes, embora sejam paródias de outras produções conhecidas do cinema indiano.

A tarefa não será tão fácil. Ele não possui muitos recursos financeiros e pede a ajuda de seus amigos, entre eles Farogh (Vineet Kumar Singh), Shafique (Shashank Arora) e Akram (Anuj Singh Duhan). Empolgados com a paixão pela arte, o grupo de amigos chega a filmar usando câmera numa bicicleta e interpretando os próprios atores da produção.

Situado entre a Comédia e o Drama, o filme equilibra esses dois gêneros sem apelar para sentimentalismos redundantes. Seja quando o povo corre alegre atrás do grupo sabendo que um novo filme será gravado, seja a melancólica cena em um dos amigos recebe a triste notícia da morte de um parente, interessante notar como alegria e tristeza se fundem no andamento da narrativa.

Após muitos desafios e com o filme lançado, Nasir é surpreendido pelo enorme sucesso alcançado. Seu filme lota as sessões de cinema. Com a fama chegando e recebendo um maior reconhecimento, é a hora que surgem algumas desavenças e desentendimentos entre o grupo. Novamente, o diretor sabe guiar a narrativa em prol da criatividade do cinema e do valor da amizade, ambos regados tanto por momentos de êxito como de turbulências.

Um dos destaques do filme é o embate entre Nasir e Farogh. O primeiro, feliz com suas paródias, o segundo, escritor talentoso porém incompreendido, deseja que Nasir siga por um caminho mais original. Outro contraponto bem ajustado ao filme: Nasir é um cineasta em ascensão que ainda precisa sair de seu conservadorismo e egocentrismo, Farogh, por sua vez, é aquele visionário que vê em seu amigo a possibilidade de um alcance mais amplo de suas criações cinematográficas.

Dessa forma, os amigos tentam se ajustar e precisam lidar com algumas diferenças. Entretanto, uma notícia muito contundente e grave está por chegar e ela afetará a vida de todos. E é o próprio Cinema que voltará a unir o grupo.

O filme carrega diversas referências e homenagens a cultura cinematográfica. Nasir é fã de Bruce Lee, Buster Keaton e Charles Chaplin. A película em si dialoga com os desafios e as técnicas da arte de filmar. Quando a história se passa após a década de 2000, Nasir fica desconfiado que o DVD de sua gravação não irá funcionar e usa a tela verde (chroma key) para criar seu filme. Cenas que representam a própria evolução do Cinema e de sua ininterrupta capacidade de nos cativar mesmo quando a tecnologia interfere.

Em 1990, Giuseppe Tornatore surpreendeu com Cinema Paradiso ao juntar Cinema e amizade na tela. Agora é a vez de Reema Kagti. Com toda uma sensibilidade e olhar atento, consegue trazer para a tela não apenas o cenário de uma cidade que usa o cinema para aliviar os problemas diários, como o sentimento da amizade em vários momentos da vida, sejam bons ou ruins.

Como disse Nasir num dos momentos mais cruciais do filme: ‘o filme não pode apenas dar certo, tem que durar pra sempre’. Kagti pode ter pensado assim ao dirigir Superboys de Malegaon. Um filme para marcar nossos corações e que merece ser visto hoje e sempre, por qualquer geração.