Embora muitas vezes assumindo um tom minimalista e frio, Ruptura se destaca pelo audiovisual e pela direção de arte
Muitas são as séries que tiveram como tema as relações e os ambientes de trabalho. Séries como Mad Men trazendo a agitação de uma agência de publicidade e The Office que mostrava o cotidiano dos funcionários de um escritório foram bons exemplos. Muito dali representa parte de nossas vidas. Apesar de espectadores, compactuamos com diversos momentos, sentimos como é trabalhar e conviver com outros empregados e de fazermos parte de uma equipe.
Ruptura (Severance) chega apresentando essa proposta. Porém, de uma forma um tanto original e se inspirando bastante em produções de Ficção Científica ou até mesmo em filmes distópicos bem perturbadores. Na trama, acompanhamos os funcionários de uma empresa, um tanto obscura, a Lumon. A empresa cria um sistema onde, após uma cirurgia cerebral com o implante de um chip, os funcionários passam a ter lembranças das vidas pessoais separadas do trabalho. Ou seja, os empregados da Lumon possuem praticamente duas vidas. O mundo exterior não influencia no interior da empresa e vice-versa.
Mas nem tudo consegue ser perfeito inclusive após a chegada de uma nova funcionária, Helly (Britt Lower), que passa a questionar os métodos utilizados. Helly está sempre em constantes conflitos com as regras impostas, inclusive passa a bater de frente com as normas estabelecidas por Harmony Cobel (Patricia Arquette), a dirigente da empresa. Não satisfeita, a funcionária passa a motivar seus companheiros e exerce neles um poder de mudança, de investigação.
O que realmente é essa empresa e como funciona todo seu sistema? No que realmente ela trabalha? Para isso, a equipe liderada por Mark (Adam Scott) que segue cartilhas pré-estabelecidas, não possui informações sobre as outras salas e trabalha de forma automatizada, precisa agir contra as regras e ultrapassar os limites do setor ao qual foram confinados. Mas isso não será fácil pois eles são altamente controlados e sequer conhecem os compartimentos da Lumon.
Com um começo até morno, a trama engrena quando a empresa começa a ser desvendada, a partir da atitude de encorajamento de seus funcionários. Com a possibilidade de a todo instante o impacto entre superiores e subordinados ficar mais intenso, é nesse ponto que reside um dos trunfos da série: sempre revelar mais mistérios, desvendar personagens com personalidade marcante, nunca ser decifrada por completo entregando respostas fáceis e completas.
Embora muitas vezes assumindo um tom minimalista e frio, Ruptura se destaca pelo audiovisual e pela direção de arte. Os longos corredores brancos que formam uma espécie de labirinto e até mesmo o movimento dos funcionários como se fossem robôs em suas rotinas de trabalho podem trazer certo desconforto, entretanto se encaixam perfeitamente na proposta da série. Destaques também para o figurino e a trilha sonora. A abertura, uma das melhores deste ano, traz uma animação soberba e que condiz muito com o espírito da narrativa. Outra curiosidade é ter Ben Stiller como um dos produtores executivos.
O casamento com outras artes como a Pintura e a Literatura também são boas estratégias para a trama. Um dos funcionários de outro setor, Burt (Christopher Walken), tem a função de organizar os quadros em lugares estratégicos da empresa. Junto a Irving (John Turturro), integrante da equipe de Mark, os dois funcionários contemplam as pinturas e debatem sobre as regras da empresa, arte e a vida. Tudo em cenas que buscam dialogar igualmente com Filosofia e Psicologia sem nada ficar maçante.
A Literatura, por sua vez, ganha força na narrativa, sobretudo quando um livro é encontrado dentro da Lumon e passa a ser um agente de transformação e de mudança do pensar dos funcionários. O livro, objeto subversivo para os padrões da empresa, é a alavanca extra que vai auxiliar a equipe de Mark e influenciará, em parte, na gradativa mudança da rotina dos empregados.
Ruptura é a prova de que ainda existe sim originalidade para chegar nas telas. Há muitas ideias a serem aproveitadas e as produções hoje em dia não precisam sobreviver só de remakes ou reboots de filmes de sucesso. Com um final espetacular da primeira temporada, dando muito gancho para a segunda, faz o espectador ficar perplexo e também questionar que a Ficção não está tão longe assim da vida real, ela inclusive assusta e surpreende muito.
Ruptura
Em andamento (2022-)
Criado por: Dan Erickson
Duração: 1ª temporada
Diretores: Ben Stiller, Aoife McArdle
Episódios: 9
Pra mim, das melhores séries de 2022.