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O rock era (é) contra tudo isso aí

"Se você tolera isso, seus filhos serão os próximos"

Jimi Hendrix
Imagem: Reprodução

Em tempos em que o autoritarismo tenta se reinventar com novas máscaras, olhar para a história do rock é como folhear um diário de resistência. Porque o rock sempre foi mais que música. Foi barulho incômodo. Grito dissonante. Risco.


Desde os anos 60, ele incomodou governos, escancarou censuras e acendeu luzes em tempos escuros. Era o som de uma geração que recusava a guerra do Vietnã, questionava o sistema, pedia paz, amor e liberdade — e, justamente por isso, era visto como ameaça.


O punk dos anos 70 explodiu como um soco no estômago da Inglaterra conservadora. Bandas como Sex Pistols e The Clash não só cantavam sobre revolta — viviam nela. Era sujo, urgente, direto. E assustava. Porque denunciava.



Na mesma década, o Pink Floyd escancarava as fissuras do sistema educacional britânico e os traumas de uma sociedade marcada por guerras e controle. The Wall não era só um álbum — era um protesto. Um grito visual e sonoro contra a opressão disfarçada de disciplina.


Nos EUA, enquanto o neoliberalismo ganhava força nos anos Reagan, bandas como Dead Kennedys, Black Flag e Bad Brains respondiam com faixas que ironizavam a política e desafiavam o discurso moralista. E aí veio o Rage Against the Machine — unindo peso, fúria e discurso direto. Com letras afiadas, contra o racismo estrutural, o imperialismo e a brutalidade policial, a banda transformou seus shows em atos de resistência coletiva. “F*** you, I won’t do what you tell me” virou um mantra.


The Clash em 1977. Foto: Adrian Boot/Reprodução
The Clash em 1977. Foto: Adrian Boot/Reprodução

No Brasil, em plena ditadura, o rock também teve seu papel. Mutantes, Secos & Molhados, Raul Seixas — todos abriram espaço para a subversão poética e musical. E nos anos 80, quando a abertura política ainda era frágil, o rock nacional virou desabafo urbano. Bandas como Legião Urbana, Titãs, Paralamas do Sucesso, Ira! e Plebe Rude levaram para o palco o sentimento de uma juventude cercada por contradições, desigualdade e desencanto. Era crítica, era crônica, era confronto.


O grunge dos anos 90 carregou esse espírito. Nirvana, Pearl Jam, Soundgarden. Contra o machismo, contra a indústria, contra a alienação. E, mais do que isso: a favor da dúvida, da introspecção, da liberdade de ser quem se é.


No Reino Unido, o Manic Street Preachers desafiava qualquer tentativa de neutralidade: suas letras panfletárias, cravadas de referências históricas, marxistas e literárias, mostravam que o rock podia — e devia — ter lado. Em If You Tolerate This Your Children Will Be Next, o aviso era direto: o fascismo cresce no vácuo da memória.



(Imagem: Ricardo Junqueira | Legião Urbana) .migalhas
(Imagem: Ricardo Junqueira | Legião Urbana) .migalhas



O rock nunca foi neutro. Porque em tempos de opressão, se calar é escolher um lado.

E por isso, até hoje, ele incomoda.


A cada vez que alguém questiona se o rock morreu, vale perguntar: morreu pra quem? Porque enquanto houver injustiça, censura e autoritarismo tentando se fantasiar de ordem, o rock vai estar lá. Em algum porão, esquina, garagem ou fone de ouvido — berrando que liberdade não se negocia.


Não se trata de nostalgia. Trata-se de coerência histórica.


O rock era (é) contra tudo isso aí. Mas nem todo mundo entendeu a letra.


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