“Minicérebro” feito com células de Alvin Lucier cria nova música experimental após sua morte
- Marcello Almeida
- há 19 horas
- 2 min de leitura
Projeto inédito une arte, ciência e questionamentos éticos em exposição na Austrália

O experimentalismo sonoro de Alvin Lucier ganhou um novo capítulo — e desta vez, ele vem direto de um “minicérebro” cultivado em laboratório. Cientistas da Universidade de Harvard criaram um organoide cerebral a partir de células do próprio Lucier e agora, mesmo após sua morte, ele continua criando música.
Batizado de Revivificação, o projeto une arte e neurociência numa experiência tão futurista quanto filosófica. A obra está em exibição na Galeria de Arte da Austrália Ocidental, em Perth, até o dia 3 de agosto, com entrada gratuita.
Lucier, que faleceu em 2021 aos 90 anos, foi um dos nomes mais radicais da música experimental no século XX. Em obras como Music For Solo Performer (1965), ele utilizou ondas cerebrais para gerar sons, e em I Am Sitting In A Room (1971), captou as ressonâncias de um ambiente até que sua voz se dissolvesse, deixando apenas o eco do espaço.
“Music For Solo Performer”, de 1965, utilizava ondas cerebrais para produzir música, e “I Am Sitting In A Room”, de 1971, registrava as propriedades físicas do ambiente em que a música era produzida.
Em 2018, Lucier começou a colaborar com a equipe do Revivificação e, já debilitado pelo Parkinson, doou células do sangue ao projeto dois anos depois. As células foram reprogramadas em células-tronco e, em seguida, transformadas em um organoide cerebral: uma espécie de minicérebro tridimensional que replica certas funções do cérebro humano.
Hoje, esse organoide está exposto dentro de uma estrutura com 20 placas de latão. Os sinais emitidos por ele são convertidos em impulsos sonoros que vibram nas placas e preenchem a sala com texturas ressonantes.
“Ressonâncias complexas e sustentadas que preenchem o espaço com som”, de acordo com a galeria.
Descubra mais sobre Revivificação aqui .
Guy Ben-Ary, um dos artistas e cientistas por trás do projeto, contou ao The Guardian que a equipe está atenta ao comportamento do organoide. “Estamos muito interessados em saber se o organoide vai mudar ou aprender com o tempo.”
A filha de Lucier, Amanda, também reagiu com bom humor à proposta. “Isso é a cara do meu pai”, ela disse, segundo Ben-Ary. “Pouco antes de morrer, ele se comprometeu a tocar para sempre. Ele simplesmente não pode ir. Ele precisa continuar tocando.”
Mas a exposição não se limita à provocação artística. O projeto também convida o público a refletir sobre as implicações éticas dessa criação. Nathan Thompson, outro membro da equipe, destacou:
“Como trabalhadores culturais, estamos realmente interessados nessas grandes questões. Mas este trabalho não fornece as respostas. Em vez disso, queremos convidar ao diálogo. A criatividade pode existir fora do corpo humano? E é mesmo ético fazê-lo?”
Alvin Lucier, ao que parece, segue criando. E agora, de um lugar entre a arte, a ciência e o além.
Veja a página da exposição da Galeria de Arte da Austrália Ocidental aqui
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