‘Hejira’ com certeza é uma obra singular, produzido com aquele fervor que vem da alma e coração. Uma Joni Mitchell desbravando caminhos, estradas e horizontes, conectada com canções sentimentais que ganham um poder gigantesco em sua voz poética e distinta. Mitchell simplesmente propõe uma entrega imersiva, a qual você precisa estar atento aos mínimos detalhes, se possível ouça esse disco totalmente desligado do mundo ao seu redor para absorver todas as nuances de uma atmosfera sonora capaz de te levar para outra dimensão... talvez seja a palavra que melhor se encaixa no contexto desse disco singular. Pode até parecer surreal, mas define muito bem minha experiência com ‘Hejira’. Até mesmo porque são canções que Joni Mitchell compôs enquanto viajava, e o disco consegue muito bem passar e transmitir essa coisa de lugares, espaço, tempo e nostalgia.
Confesso que havia algum tempo que não ouvia esse disco, estava mais conectado com ‘Blue’ e achei ‘Hejira’ em um sebo na internet por um preço amigo, e essa reconexão com o álbum surtiu um efeito positivo e diferente, talvez magistral e impactante, seriam as palavras que melhor exprime minhas emoções diante dessa obra soberba de uma grande artista da cultura pop. Dito isso, ele assume o posto em relação a (minha) preferência quando se trata de Joni Mitchell. Adoro ‘Blue’ considero-o uma obra-prima, mas ‘Hejira’ se tornou minha nova devoção desse universo chamado Joni Mitchell.
As canções podem transparecer complexidade, mas, na verdade, ela sabe muito bem contar histórias como ninguém, uma poetiza, com muita sensibilidade. Muitos até dizem que ela é o “Neil Young de saias”. Eu prefiro acreditar em minhas convicções de que ela simplesmente é uma compositora e musicista de outro mundo, cercada de emoções, sentimentos, dores e alegrias. Sua música transborda assuntos da alma docilmente. Muito disso se deve a sua sonoridade ligada ao Pop com elementos jazzistas, incrivelmente muito bem explorados, e para isso funcionar tão profundamente belo teve a contribuição do baixista norte-americano de Jazz, Jaco Pastorius (enaltecido por muitos como um dos mais influentes e importantes baixistas de todos os tempos), peça fundamental na construção das canções de ‘Hejira, trouxe para o disco uma atmosfera absurdamente experimentalista, as linhas do baixo em cada faixa do álbum soam como notas celestiais.
Além dessas características, Mitchell estava muito conectada ao Jazz, suas letras fazem referência ao gênero, bem destacado na faixa “Hejira” uma canção cheia de detalhes meticulosos e experimentais onde os instrumentos um sobrepõe o outro, um detalhe sensacional e desconexo que traz um processo criativo no mínimo exuberante. “Song For Sharon” resgata harmonias e vocais estáticos relevantes e vigorosos, enquanto “Refuge Of The Roads” se apresenta elegante e cativante com seus toques balanceados por uma levada de sopros que lembra muito o álbum ‘For The Roses de 1972, enquanto “Coyote” chega como uma faixa ligeira de guitarras dedilhadas e bem trabalhadas. A conexão entre vocais e instrumental se equilibra agridocemente.
Mas no geral ‘Hejira’ é um trabalho mais conceitual que escorrega sabiamente para as vertentes do Jazz (talvez o álbum mais Jazz de Mitchell), prototípico, lento e apropriadamente suave, esfumaçado e energicamente agitado, como a canção “Blue Motel Room” e suas camadas jazzísticas surpreendentemente belas e apreciadoras. Um baita disco de escuta gratificante e reconfortante.
Ficha Técnica:
'Hejira'
data de lançamento: 1 de novembro de 1976
Gênero: Rock, Pop, Jazz e Folk
Ouça: "Coyote", "Hejira" e "Songs For Sharon"
Para quem gosta de: Neil Young e Bob Dylan
Spotify com Joni Mitchell:
Veja Mitchell tocar ao vivo a faixa "Coyote" abaixo:
Sobre Marcello
É editor e criador do Teoria Cultural.
Pai da Gabriela, Técnico em Radiologia, flamenguista, amante de filmes de terror. Adora bandas como: Radiohead, Teenage Fanclub e Jesus And Mary Chain. Nas horas vagas, gosta de divagar histórias sobre: música, cinema e literatura. marce.almeidasilvaa@gmail.com
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