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Foto do escritorEduardo Salvalaio

Ensoulment recaptura o senso poético, crítico e filosófico do The The após um longo hiato

Após 25 anos sem novidades, "Ensoulment" revela um Matt Johnson de 63 anos conectado com o mundo atual

The The /Matt Johnson
Imagem: Reprodução


The The é um grupo inglês formado em 1979. Entretanto, foi na figura emblemática de Matt Johnson que o The The ficou bastante conhecido. Ele é o único integrante fixo numa banda que teve a participação de ilustres músicos como o guitarrista Johnny Marr (ex-The Smiths) e a baixista Gail Ann Dorsey (que tocou com David Bowie e Tears For Fears).

 

Matt é inquieto, homem de olhar atento sobre o mundo, um poeta dos tempos modernos que talvez nunca tenha recebido seu devido valor. Admirada mais como uma banda cult, The The geralmente não é tão lembrado quando o assunto é a famosa cena musical 80’s, mesmo que o grupo tenha lançado discos eficientes a exemplo de Soul Mining (1983), Infected (1986) e Mind Bomb (1989).

 

As décadas seguintes não foram tão fortes para Matt, entretanto discos como Dusk (1993) e NakedSelf (2000) ainda apresentavam seus belos momentos. Sem lançar canções inéditas, a vida pós-2000 seguiu por seu envolvimento com trilhas sonoras e por projetos inusitados como Hanky Panky (1995), disco esse onde Matt fazia releitura de algumas canções do ícone country Hank Williams.

 

O mundo não parou. Os problemas que Matt cita em suas letras sagazes e bem arquitetadas desde 4 décadas atrás continuam. Ele sabe digerir o momento que vive, passa em seu lirismo musical as características de um mundo frágil que não consegue se desligar das mazelas e erros do passado, consegue definir as particularidades das gerações de cada década (como fez tão bem na canção "The Beat(en) Generation" em 1989).

 

Nem tudo foi fácil. Matt passou uma fase conturbada. No começo da pandemia de Covid-19, precisou ficar recluso num hospital para a retirada de um abscesso em sua garganta, tempo esse que ficou impossibilitado de cantar. Essa passagem, inclusive, acaba sendo encaixada na letra de "Linoleum Smooth To The Stockinged Foot" ‘Descending stairwells of the mind / Drenched in morphine and iodine...’.



Vinte e cinco anos sem lançar novidades, Ensoulment chega trazendo um Matt Johnson de 63 anos antenado com o mundo ao seu redor. O músico produziu o álbum junto ao experiente Warne Livesey (que também produziu Mind Bomb).

O disco saiu pelo Cienola, selo londrino criado pelo próprio Matt. O compositor recebeu a colaboração de alguns integrantes de longa data como Barry Cadogan (guitarra), James Eller (baixo), DC Collard (teclados) e Earl Harvin (bateria).

 

Logo na abertura com "Cognitive Dissident", Matt traça paralelos dentro um mundo moderno e dominado pela tecnologia, onde redes sociais e aplicativos fazem parte da rotina. Afiado como sempre, o próprio músico nos convida a refletir sobre o que está sendo escutado ali. As letras continuam em destaque e nunca estiveram tão sinceras como agora (portanto, esse é um disco que deve abalar quem não gosta de ouvir algumas verdades).


"Some Days I Drink My Coffee By The Grave Of William Blake" é um Folk preciso e representa uma justa homenagem ao pintor e poeta inglês que era contra as injustiças e que acabou morrendo na pobreza apesar de seu talento. Cantando com um jeito Scott Walker/Leonard Cohen de ser, Matt desfia sua poesia intacta.

 

Dois momentos se entregam ao Blues, gênero esse que sempre esteve presente na discografia da banda. "Zen & The Art Of Dating" chega com vocal mais imponente e instrumental realçado, sobretudo o baixo. "Down By The Frozen River" é uma faixa abraçada por um piano sombrio com o músico declamando uma espécie de recital.

 

"Life After Life" representa bastante o jeito de composição da banda. Canção com andamento lento mas que repentinamente ganha um impulso oferecendo um refrão poderoso. "Where Do We Go When We Die?" é envolvida por guitarra dedilhada reforçada pelo dueto eficaz entre vocal masculino e feminino. Embora a letra trate de temas pesados como velhice e morte, ela não é melancólica por conta de sua melodia contagiante e fácil de decorar.



Um grupo cujo mentor ainda está muito preocupado com um mundo que não consegue se curar. É muito gratificante quando nos correspondemos com algum artista que discute sobre os mesmos problemas que temos e que está tão consciente do mundo em que vive. Matt e seu The The sabem bem disso e fazem de Ensoulment um bom retorno.

 

Ensoulment

The The


Ano: 2024

Gênero: Indie Rock, Alternativo, Indie Pop

Ouça: ‘Cognitive Dissident’, 'Life After Life', "Zen & The Art Of Dating"

Humor: Catártico, Sombrio, Sensual


 

NOTA DO CRÍTICO: 7,5

 

Veja o vídeo oficial de ‘Cognitive Dissident’:


 


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