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Foto do escritorMarcello Almeida

Como o Television fez o rock pensar fora da caixa?



Se há uma coisa que Marquee Moon ensina, é que o rock, em sua essência, é mais do que rebeldia ou entretenimento

Television: Fred Smith, Tom Verlaine, Richard Lloyd e Billy Ficca
Television: Fred Smith, Tom Verlaine, Richard Lloyd e Billy Ficca - Imagem: Reprodução.

Em uma Nova York que fervilhava de criatividade e rebeldia, onde o punk rock ganhava forma nas paredes sujas do CBGB, o Television parecia caminhar contra a corrente. Enquanto o movimento se apoiava na visceralidade crua de três acordes e letras diretas, a banda liderada por Tom Verlaine optou por algo mais complexo, mais ousado e, de certo modo, mais duradouro. Eles não se contentaram em apenas fazer barulho — eles queriam pintar quadros sonoros, explorar a profundidade e transformar o rock em uma experiência quase transcendental.


No centro de tudo estava Verlaine, uma figura enigmática que enxergava a música como uma extensão da poesia. Suas letras não eram meros refrões, mas narrativas fragmentadas de uma cidade que vivia entre o caos e a introspecção. Ao lado de Richard Lloyd, ele criou uma das parcerias de guitarra mais inovadoras da história do rock. Não havia solos exagerados nem riffs previsíveis: suas guitarras conversavam, se entrelaçavam, criavam texturas. Era um som que exigia atenção, mas que recompensava com emoção crua e beleza inesperada.


A revolução de Marquee Moon

Imagem: Reprodução.

Quando o álbum de estreia do Television, “Marquee Moon”, foi lançado em 1977, ele soou como algo completamente fora do tempo. A faixa-título, com seus quase 11 minutos, desafiava todas as convenções da época — especialmente no contexto do punk, onde a urgência e a brevidade eram quase dogmas. Mas Marquee Moon não precisava de pressa. Era uma construção lenta, uma narrativa sonora que te puxava para dentro e te mantinha cativo até o último acorde.


O álbum inteiro é uma demonstração de como o rock pode ser elevado a uma forma de arte sem perder a visceralidade. Em faixas como See No Evil e Friction, há uma energia que pulsa com intensidade, mas que nunca se rende à simplicidade óbvia. Cada nota parece pensada para transmitir algo maior, e a produção seca, quase sem adornos, amplifica a autenticidade da banda.


Marquee Moon não foi um sucesso comercial imediato, mas sua importância foi reconhecida quase instantaneamente por críticos e músicos. Ele abriu caminho para o que viria a ser chamado de pós-punk, influenciando uma geração de bandas que enxergaram na experimentação uma forma legítima de rebeldia.



Um novo papel para o rock


O Television fez algo que poucas bandas conseguiram: redefinir o papel do rock sem abandonar sua essência. Eles provaram que o gênero não precisava escolher entre emoção e inteligência, entre técnica e alma. O que eles criaram foi uma fusão rara, em que cada elemento — das letras introspectivas de Verlaine ao entrelaçamento melódico das guitarras — contribuía para algo maior, algo que parecia ultrapassar os limites do gênero.


E mais: eles transformaram a guitarra. Não como um instrumento de ego, mas como uma ferramenta de expressão pura. O diálogo entre Verlaine e Lloyd foi revolucionário, influenciando artistas que buscavam ir além do óbvio, desde Johnny Marr, do The Smiths, até bandas contemporâneas como The Strokes.


O legado de uma banda singular


Apesar de sua curta discografia — apenas três álbuns em sua formação clássica, Marquee Moon (1977), Adventure (1978) e Television (1992) —, o impacto da banda é imensurável. Eles não foram apenas um grupo influente; foram uma mudança de paradigma. Sem eles, talvez o rock alternativo e o pós-punk não tivessem a profundidade ou a coragem que conhecemos hoje.


O Television nunca foi sobre vender discos ou lotar estádios. Eles eram sobre a conexão íntima entre artista e ouvinte, sobre o momento em que uma música deixa de ser apenas som e se torna experiência. É isso que os torna atemporais.


Se há uma coisa que Marquee Moon ensina, é que o rock, em sua essência, é mais do que rebeldia ou entretenimento. É uma busca incessante por significado. E, nesse sentido, o Television se tornou eterno.


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