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Foto do escritorEduardo Salvalaio

A Substância questiona vícios e vaidades atrelados a regras para padrões de beleza e que condenam a velhice

Embora seja classificado dentro do gênero Body Horror, a diretora consegue embutir uma mescla de Humor Negro, Drama e mesmo Sci-Fi

Crédito: MUBI


Durante o filme A Substância (2024) é feita uma pergunta a Elizabeth Sparkle (Demi Moore): ‘Você já sonhou com uma versão melhor sua?’. Difícil o espectador não compactuar desse sentimento, sobretudo quando se pensa sobre velhice, solidão e, inclusive, quando somos tomados pela ideia de que nunca fizemos o suficiente ou de que erramos muito na vida.

 

O filme da diretora e roteirista francesa Coralie Fargeat é ousado, polêmico, controverso e cutuca muitas feridas, algumas delas ficarão ainda mais expostas conforme tudo seja digerido gradualmente.   

 

Repleto de metáforas, alegorias e simbolismos, certamente essa é uma das produções dos últimos anos que mais faz da ficção um dilaceramento de um mundo moderno onde algumas pessoas não medem esforços para buscar uma sonhada juventude eterna. Uma época em que são criadas regras que ditam os padrões de beleza e onde existem sacrifícios para se sobressair na mídia e não perder a fama.

 

Vaidade, vícios, o temor da velhice, o novo sobrepujando o antigo. A Substância entrega muito sobre nossa sociedade. As regras para os padrões de beleza que costumam segregar quem não está inserido nelas, a cultura da mídia moderna e seu endeusamento excessivo.

 

Logo no início, é exibida a confecção da estrela de Elisabeth na calçada da fama. Em seguida, acompanhamos o passar do tempo, quando um lanche de um rapaz cai no chão e acaba sujando a estrela, que já se encontra bem desbotada e com trincas. Perfeita a cena que envolve o antagonismo entre o auge da fama e a decadência da artista (um dos temas aproveitados na trama).

 


Posteriormente, o espectador fica diante da figura de Harvey (Dennis Quaid numa interpretação exaltada). Empresário de TV que representa perfeitamente a figura do patrão machista, debochado e inescrupuloso. Causa pavor, na oportuna intenção do filme, a cena onde ele janta abusando de seus modos nojentos e imundos com Elisabeth, por meio de um discurso machista e egoísta.

 

Créditos: Youtube / Working Title Films

Neste momento, importante destacar a importância do zoom da câmera nos trejeitos grotescos e espalhafatosos de Harvey. Uma passagem que nos coloca como estivéssemos na pele de Elisabeth, sufocada pela ironia do empresário, um homem preocupado apenas com seus lucros e com a audiência do programa.

 

Elizabeth é uma renomada apresentadora de programa de TV que agora começa a perder espaço. Triste contemplar a cena onde ela presencia a retirada de sua imagem num outdoor da cidade. O programa de TV precisa de um corpo mais jovem. Após um acidente, ela recebe a proposta de usar um composto químico que lhe dá direito a uma mudança em sua vida. Essa experiência chega cercada de regras que precisam ser cumpridas diariamente.

 

Junto com Demi Moore, Margaret Qualley reforça a película com uma atuação grandiosa. A atriz da série Maid vem demonstrando amadurecimento a cada nova produção. Ela vai incorporar Sue, uma apresentadora novata que passa a ser a nova sensação de um programa de TV. Mais jovem, esbanjando fôlego e sensualidade, ela explode na mídia.

 

Na personificação de Sue, o filme também explora a extrema sexualização nos programas de TV. Inclusive, na cena onde Sue é contratada, observamos os dois recrutadores fazendo piadas machistas com as outras candidatas que foram reprovadas.

 

A partir do momento que as duas atrizes estão presentes na tela, o filme ganha densidade, concentra suas críticas de forma bem crua e faz com que o espectador fique aguardando por mais cenas de impacto (e elas virão). Sue é a jovem obstinada que não mede esforços para continuar alavancando sua fama, Elisabeth luta contra sua própria decadência.

A trilha sonora, maquiagem e figurinos contribuem para a atmosfera de um filme onde a estética visual é importante na construção de muitas ideias e na caracterização de cada personagem. Outdoors espalhados pela cidade expondo Sue acabam passando a noção de um mundo manipulado pela cultura do corpo bonito.

 

É um filme que recebe variadas influências e inspirações, sem perder um sabor especial de originalidade e criatividade. Fácil identificar elementos narrativos que estão presentes tanto em livros como O Retrato de Dorian Gray (1890) de Oscar Wilde como nos filmes do cineasta David Cronenberg.

 

Créditos: Youtube / Working Title Films

Os 20 minutos finais podem ser considerados como exagerados ou então, até desconexos. Engana-se. É a hora de mostrar como muitas pessoas criam ‘monstros’ ao exagerar em suas formas de embelezamento, de permanecerem na mídia e de tentar escapar da infalível velhice. Claro que pode ser um momento que o espectador sinta-se desconfortável, que deseje sair da sessão apavorado, apesar de que continue absorvendo lentamente sobre o que viu.

 

Embora seja classificado dentro do gênero Body Horror, a diretora consegue embutir uma mescla de Humor Negro, Drama e mesmo Sci-Fi. Mesmo o gore que chega em determinadas cenas nojentas não está ali sem um propósito, acaba se encaixando perfeitamente para mostrar a própria nojeira que costuma acinzentar nossos corações. Esteja preparado.

 

A Substância

The Substance


Ano: 2024

Gênero: Terror, Ficção Científica, Drama

Direção: Coralie Fargeat 

Roteiro:  Coralie Fargeat 

Elenco: Demi Moore, Denis Quaid, Brett Gillen, Margaret Qualley

País: Estados Unidos, França

Duração: 140 min


 

NOTA DO CRÍTICO: 8,5

 

Trailer:



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